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(NÃO MEXER)

Palavras E As Mil E Uma Noites

O conto das “Mil e Uma Noites”, já naquela época, falava da falta de “algo a mais” num relacionamento entre homem e mulher. Conta a história que um sultão mantinha um harém com as mais belas mulheres, e a cada dia escolhia uma para que passasse a noite em seus aposentos. Mas, pela manhã, a bela jovem escolhida aparecia decapitada. Ele já matara mais de três mil mulheres quando conhece Scheherazade. Esta olhou profundamente em seus olhos e imediatamente apaixonou-se. Decidiu, então, que queria ficar até o fim de seus dias com aquele homem.
Uma vez nos aposentos do rei, Scheherazade, que tinha lido livros de toda espécie, conta uma história que, como havia planejado, cativa a atenção do rei. Mas ela interrompe a narrativa para a concluir apenas na noite seguinte. Curioso para saber o fim da história, o rei não manda matá-la. Nas noites seguintes, excitado com a narrativa, o rei pede novas histórias, e assim ele a mantém viva até que, depois de mil e uma noites e três filhos, entretido e moralmente elevado pelas histórias, faz Scheherazade sua rainha. Foi a magia das palavras que manteve este relacionamento. Palavras... o que tem mais poder que isto? Elas uniram e destruíram impérios; empossaram e destituíram líderes; declararam guerras e selaram a paz. Destruíram amores, uniram ou mantiveram unidos amores, mesmo a distância.
Hoje em dia, há uma dificuldade enorme de relacionamentos e também com as palavras. Pouco tempo para escutar o outro, uma pobreza de palavras ditas ou escritas. Imperam a velocidade, a novidade, a rotatividade, a prática do “ficar com” e a frouxidão de relacionamentos. O padrão da modernidade é o fast love, a satisfação imediata de interesses afetivos e ou sexuais na balada, sem vínculos. Somente os prazeres da carne. É um (des)encontro de corpos.
Vivemos num tempo de (in)satisfações parciais, do não se prender, ficando à disposição, relacionando-se com o que der e vier. Relacionamentos frívolos e muitas vezes curtíssimos, a ponto de nem saber o nome do parceiro, quem dirá a troca de umas poucas palavras. Como atingir a alma, o coração?  Homens e mulheres estão à procura de um parceiro (in)atingível, neste emaranhado de fast love. Queixam-se de um vazio, da solidão, mesmo a dois. É um (des)encanto geral. Não conseguem identificar por que é tão difícil um relacionamento completo, pleno e duradouro. A magia das palavras foi esquecida.
Como resultado desta busca frenética, sem mesmo saber o que se busca, apaixonam-se e desapaixonam-se como num apertar de botões. O “vazio” é enorme e a (in)satisfação impera. Há uma afirmação de Nietzsche, a qual concordo plenamente: “Ao pensar sobre a possibilidade de relacionamento, cada um deveria se perguntar: você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até sua velhice? Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar.”  Scheherazade sabia disso. Sabia que os relacionamentos baseados nos prazeres da cama são decapitados pela manhã e terminam em separação. Quando o sexo já estava morno na cama, e o amor não mais se podia dizer através dele, Scheherazade o ressuscitava pela magia da palavra: começava uma longa conversa sem fim, que deveria durar mil e uma noites. O sultão calava-se e a escutava como se fosse música.
A música dos sons ou da palavra – é a sexualidade sob forma da eternidade: é o amor que ressuscita sempre.

Neuza Frantz Bonila

A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos também a felicidade."

Carlos Drummond de Andrade

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